Conheça a história do indígena feiticeiro condenado pela inquisição




Os indígenas do Brasil foram perseguidos pela Inquisição? É a essa pergunta que a pesquisa "
Feitiço Caboclo: um índio mandingueiro condenado pela Inquisição" procura responder. 

O trabalho, publicado recentemente em forma de livro, segue a trajetória de um raro indígena que caiu nas garras do Santo Ofício português. Mas quem era, afinal, esse sujeito? 

Miguel Pestana, indígena aldeado natural do Espírito Santo e que viveu boa parte de sua vida no Rio de Janeiro, foi perseguido por ser um afamado mandingueiro, fazendo uso de bolsas que acreditava lhe proteger de perigos e conceder fortuna. 



A vida deste indígena, inclusive, não poderia ter sido mais inusitada: desobediente aos ensinamentos jesuíticos, ele fugiu da aldeia de Reritiba, único lar que ele conheceu até o início da vida adulta, e rumou para o Recôncavo da Guanabara (atual Baixada Fluminense), onde passou a ter uma nova existência. 

Convivendo em ambientes plurais do ponto de vista étnico, cultural e social, Miguel confundiu-se em meio à população mestiça quando viveu nas freguesias do Recôncavo da Guanabara, chegando inclusive a ocupar o posto de capitão do mato em Inhomirim

Foi junto a um escravo que capturou, aliás, que ele teve o primeiro contato com a bolsa de mandinga. A grande reviravolta na trajetória deste indígena ocorre no ano de 1737, quando ele foi preso durante uma visitação enviada pelo bispo à freguesia de Inhomirim, onde então morava. 

Denunciado por fazer uso de bolsas de mandinga, Miguel tornou-se alvo da ação inquisitorial. Inicialmente levado ao aljube do Rio de Janeiro, o indígena aguardou por cerca de cinco anos nesta prisão até ser remetido aos cárceres secretos do Santo Ofício, em Lisboa. 



Durante esse período, os testemunhos que constam em seu processo inquisitorial são unânimes em afirmar que Miguel, mesmo preso, vendia bolsas de mandinga, pós supostamente mágicos e escritos mágicos aos que iam procurá-lo, como negros, mulatos e até mulheres brancas, que davam a ele dinheiro e prendas de ouro por seus serviços. Evidência clara da circulação de diferentes crenças na sociedade colonial. 

Quando finalmente deixou a prisão do aljube, o indígena não teve muito o que comemorar. Já em Lisboa, Miguel Pestana seria julgado e sentenciado às galés pela Inquisição em 1744, tornando-se um dos poucos indígenas provenientes da América portuguesa a ser condenado pelo Santo Ofício. 

Recorrendo aos métodos da Micro-História e seguindo os princípios da Nova História Indígena, a pesquisa usa a trajetória de Miguel para ressaltar as diferentes formas de inserção dos indígenas à sociedade colonial, trazendo luz aos múltiplos processos de mestiçagem que ocorreram nos trópicos.


Texto escrito por Luís Rafael Araújo Corrêa, doutor em História Social pela Universidade Fluminense, com tese indicado ao Prêmio CAPES de Teses (2018). Possui Mestrado em História Social pela Universidade Federal Fluminense e é graduado em História pela mesma universidade, tendo atuado como bolsista de iniciação científica durante esse período. Atualmente é docente do Colégio Pedro II e coordenador de História do campus Duque de Caxias.


A pesquisa completa pode ser acessada aqui. E, aqueles que se interessam pelo livro podem comprá-lo neste link


ÍNDIO OU INDÍGENA?


Para complementar a leitura, indicamos o vídeo da intervenção feita por Daniel Mundukuru, escritor e curador do Mekukradjá, durante a edição Mekukradjá 2018 organizado pelo Instituto Itaú Cultural. 

Assista: 


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